OS VELHACOS
- Nei Damo
- 31 de mai. de 2020
- 3 min de leitura
“Se iremos transgredir, então que o nome seja apropriado” Os Velhacos é o nome de uma quadrilha que estou formando. Simples assim.
A ideia foi baseada no fato de que criminosos de colarinho branco pouco tempo ficam presos, mormente os de mais idade, e por isto, Os Velhacos é formada por pessoas com mais de 70 anos. Em caso de prisão, a orientação é de consentir, sem resistência, a ser levado em cadeira de rodas até a Polícia Federal para depor, e lá, simplesmente declarar: “Não vou falar porque não tenho condições físicas e emocionais”. Pronto. E em mais dois dias, com ótimos advogados, o companheiro estará de volta ao bando doce bando.
No campo espiritual, tranquilizamo-nos, pois o Papa disse que o Inferno não existe. E o disse em latim: “Non est Infernum”, como se Deus estivesse soprando a frase em seu ouvido.
O objetivo da quadrilha é, descaradamente, roubar. Roubar e roubar bem, não da população, mas do governo. Seria uma espécie de contrapartida ao que ele nos leva e gasta mal. E melhor ainda: sem dor na consciência e com alegria.
Autoridades para nos dar habeas corpus não nos faltarão, e nem advogados caros e, para estes, não faltará dinheiro, conseguido num plano secreto e extremamente confidencial, de grandes roubos.
Na Série da Netflix, “La Casa de Papel”, o mentor de um audacioso plano arregimenta assaltantes e lhes pede para que cada um escolha um codinome, baseado num tema. Eles escolhem “cidades”, passando a se tratar por Denver, Berlim, Tokio, Rio, etc, como forma de preservar as identidades. Colocada a ideia para os membros da minha quadrilha, o grupo de Os Velhacos escolheu o tema, plausível, de “remédios”.
Por enquanto, nosso grupo é formado por treze aguerridos companheiros, de codinomes Anlodipino, Natrilix, Celebra, Aspirina, Selozok, Ticlid, Azitromicina, Vitoryn, Omeprazol, Doril, Cloroquina, Dorflex e Tylenol.
Todos passaram nos exames médicos, e se houvesse algum caso, mesmo leve de Parkinson ou Alzheimer, estes seriam gentilmente recusados, com uma exceção e, explicadas as razões somente ao portador de Parkinson. A exceção fica por conta de termos a necessidade de um componente portador de Alzheimer. Este nosso parceiro terá o cargo de ouvidor. Todas as reclamações, sugestões e conselhos serão dirigidas a ele. Precisamos também nos tornar conhecidos para angariar a simpatia do público. Para tanto, vamos nos filiar ao PT, PMDB, PSDB, PP, ou outro partido qualquer. A escolha é livre.
Num ônibus adaptado, com enfermeiro, caviar, champanhe e maconha, ao invés de mortadela e tubaína, formaremos uma claque disposta e barulhenta. A arte na pintura do ônibus será de um artista brasileiro reconhecido internacionalmente, ainda a ser escolhido. O hino da quadrilha será o resultado de um concurso de composição, com o prêmio de dois milhões de reais. Vai ter que ser mais cantado do que Garota de Ipanema, de norte a sul e de leste a oeste. Um sucesso.
Num evento onde estiver, por exemplo, o Sarney, a ruidosa e embandeirada claque bradará:
Sarney Sarney Sarney! É verdade pura!!!
Marimbondos de Fogo Nobel de literatura!!!
Se o evento for do PSDB, a claque com a força restante dos pulmões gritará: Aécio Neves! Aécio Neves!! Contigo estaremos for éves!!
Em algum evento do centrão, estaremos lá.
Ão ão ão – Vida longa ao centrão!
O plano é ficarmos conhecidos, com a claque e o ônibus rodando em festa pelo país, como ”Aqueles simpáticos velhinhos”.
Em convenções do PT e em convenções de partidos a serem criados, é melhor sem claque, que estes partidos já tem a deles e iriam desconfiar da nossa. Basta então mandar aos diretórios dos partidos perfis do Facebook de alguns parentes e amigos.
Nesta fase inicial vamos formar grupos de ação. Por exemplo, como o Tylenol tem boa visão para perto e o Celebra tem boa visão para longe, eles formarão o Grupo de Observação e Vigilância, fazendo rodízio com o Natrilix e o Dorflex, onde um é surdo mas enxerga bem e o outro enxerga mal mas ouve bem.
Teremos um centro de operações num lugar ermo e lindo, a beira mar, como esconderijo. E neste lugar, lá no fundo, numa estufa bem escondida, uma plantação de maconha para abastecer o ônibus. Resort Easy Money, Coisa de cinema.
A vigilância noturna dos limites da área será feita por três companheiros, em cadeiras de rodas, elétricas e silenciosas. O objetivo de ser um trio é sempre ter, pelo menos, um acordado.
Enquanto se aprimora o plano do primeiro assalto aos cofres públicos, precisamos treinar a perseverança e o sacrifício: em três dias todos têm que ler, completo, o livro Marimbondos de Fogo.
Lamentamos o fato do Conselho da quadrilha Os Velhacos ter vetado um candidato, promotor aposentado, de boa aparência e ótima saúde.
— E qual a razão? Perguntou o companheiro Doril.
— O Conselho optou pelo indeferimento por causa do codinome escolhido.
— Diabos! E qual foi o codinome que ele queria?
— Viagra!
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